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EDITORIAL | Pedido de desculpas a Christina Aguilera

Na faixa “Save Me From Myself”, Christina Aguilera canta: “Me amar não é tão fácil / Fica tão complicado”. A faixa, parte do segundo disco do “Back to Basics”, álbum duplo lançado pela cantora em 2006, durante seus tempos áureos, foi escrita em homenagem ao (ex-)marido Jordan Bratman. Mas parece que esse foi o trecho que mais se encaixou na relação dos fãs com a artista.

Passaram-se exatos 2001 dias entre o lançamento do “Lotus”, quinto álbum de Aguilera, e o anúncio oficial do “Liberation” e, para além de um hiatus de álbum, foi um período em que os fãs sofreram com sumiços e falta de informações. A ausência de novidades foi tanta que um dos fansites brasileiros mais acessados e antigos sobre a cantora resolveu encerrar suas atividades.

É verdade que, nesse período, Christina participou de mais 3 temporadas do “The Voice”, voltou a atuar, lançou duas parcerias muitíssimos bem sucedidas (“Feel This Moment”, com Pitbull, e “Say Something”, com A Great Big World), fez um tributo aqui e outro ali e chegou até a ganhar um Grammy. Foi uma deserto tour com poucos, mas significativos, grandes momentos. Justiça seja feita.

Como fã, creio não estar me equivocando ao falar que o  que mais chateou estes guerreiros sobreviventes foi a falta de contato – e até certo descaso – de Christina com os fãs. Ela, que sempre foi reservada e avessa a redes sociais, que, quase sempre são atualizadas pela equipe, se mostrava cada vez mais isolada. Mesmo bons momentos, como a carta aberta publicada em 2013 ou quando ela pegou o próprio celular (aquele Blackberry dela tem acesso à Instagram ou ela já trocou?) e fez um puta overposting mostrando a casa e objetos pessoais, não nutriram a nossa falta de Christina.

No entanto, é quase impossível escutar o “Liberation” sem entender o momento em que ela passava e sentir quase uma culpa pelos momentos de acusações e incompreensões por parte de nós, fãs. Suas dúvidas, medos e angústias para com a vida e a carreira ficam explícitas, principalmente, em “Maria”, que é assertivamente introduzida por “Searching for Maria”, do musical “A Noviça Rebelde”, uma das primeiras referências de Christina, fundamental para sua formação como artista e intérprete.

Na primeira faixa completa do disco, Christina canta: “Cansada de me maquiar / Porque isso não vai esconder minhas feridas profundas (…) Eu só quero vê-la / Cadê Maria?”. Maria, justificada como a personagem do tal musical, é, claramente, uma referência a sua própria essência. Mesmo com mudanças na vida pessoal, pode-se considerar que Christina fala muito sobre sua carreira artística. Sim, Christina se perdeu e claramente, havia perdido também a vontade de estar na indústria.  

Mas como uma artista que já havia quebrado tantos paradigmas e já tinha se afirmado como uma performer de identidade e atitude poderia estar tão perdida e sem rumo? “Stripped”, “Back to Basics” e até mesmo o “Bionic” já não representam libertação? As respostas estão nos acontecimentos que marcaram Christina na última década.

Mesmo lançando álbuns ousados que fugiam dos padrões da música pop em seus respectivos períodos, Christina foi muito bem sucedida em termos de vendagem. Juntos, seus álbuns de 2002 e 2006 contabilizam 20 milhões de cópias vendidas. Até que chegou a década atual. Com uma proposta completamente diferente dos trabalhos anteriores, o quarto álbum se assemelhou com os outros no processo criativo: Christina no controle, escrevendo a maior parte das letras e trabalhando com nomes pouco populares na cena mainstream.

Em 2010, ela experimentou, pela primeira vez, o fracasso comercial. O “Bionic” vendeu bem menos que o esperado, ajudou a popularizar o termo “flop” e a artista se viu diante de uma gigantesca crise de imagem. Christina, que sempre aparentou não se importar com repercussão de charts, mostrou que talvez isso importasse um pouco sim. E o resultado foi o maior erro da sua carreira: “Lotus”.

A começar pelo tempo de produção: pouco mais de 1 ano. Quem conhece a discografia de Christina sabe o buraco de anos que sempre existiu entre suas obras, mas, em 2012, ela pareceu ter tido pressa para entregar um novo trabalho. Christina escalou um dos nomes mais óbvios, Max Martin, produtor de diversos hits pop, para o álbum. Ela se afastou mais do processo de composição e gravou diversas músicas já pré-prontas. Fora o caráter pretensioso: em diversas entrevistas, Christina praticamente prometia estar gravando o sucessor do “Stripped”.  

Como pressa é inimiga da perfeição, o álbum virou uma coletânea de músicas pop clichês com produções mal acabadas e vocais gritados e mal masterizados. Outro fracasso nos charts, mas o baque foi ainda maior: Christina havia, pela primeira vez, decepcionado seus fãs quanto à qualidade do material.

“Lotus” nada mais é que o grito de desespero de alguém que parecia não querer perder o espaço que tinha no mercado. Não é um álbum pensado artisticamente, é estratégico. Independente se a vontade partiu da artista ou da gravadora, foi aí que Christina se perdeu e que pareceu que tínhamos a perdido também.

Não foram anos fáceis para os fãs, mas ouvir o “Liberation” e sua qualidade incontestável é como um longo suspiro de alívio. Por isso, utilizo esse espaço para pedir desculpas à Christina por cada vez que eu cobrei rapidez no lançamento do álbum ou a acusei de negligência quanto a carreira. Por mais angustiante que tenha sido a demora, ela serviu para reconectar Xtina com suas verdadeiras potencialidades. Maria foi encontrada com vida.  

No “Liberation”, Christina explora variadas vertentes e se desafia como artista. Ele não vai vender como água e pode ser que seja novamente ignorado no Grammy. Mas é isso que faz com que o álbum mate o espírito “Lotus” que ainda assombrava a fanbase: ela não está fazendo música com qualquer pretensão além de entregar um trabalho bom. Graças aos deuses, “Liberation” não é um “Lotus 2.0”, mas também não é um “Stripped 2.0”: é diferente, único e um tanto quanto transgressor. E é exatamente isso que se espera de um álbum de Christina Aguilera.

Ela precisou de 6 anos para se reencontrar enquanto artista, mas, mais importante, ela finalmente aparenta entender o valor que tem. Não apenas como uma força na indústria e como a artista que influenciou diretamente uma geração inteira de powerhouse vocalists. Mas como alguém que usa seu talento para trazer mensagens e inspirar pessoas ao redor do mundo.

O gênio está finalmente liberto da garrafa. Volte pra ficar, Christina.

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Escrita por Matheus Queiroz

Jornalista e amante de cultura pop.

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