“Interior” é a nova música de trabalho de Rashid com parceria do Rapper RAPadura Xique-Chico, compositor e produtor natural de Fortaleza. Apesar da distância geográfica que os separa, o paulistano e o cearense dividem muito mais do que o apreço pelas rimas e estão em busca da diversidade musical que pode caber dentro de um Rap, como demonstram nessa co-autoria.
Com beats e produção de Skeeter, a composição ganhou colagens por DJ RM e o tema reflete sobre o íntimo de cada indivíduo. Eles compartilham suas experiências pessoais longe dos grandes centros, Rashid com sua vivência passada, no interior de Minas Gerais e RAPaduraa em Pernambuco.
Na nova música, os rappers mostram questões políticas, de linguagem, xenofobia, movimentos sociais e preconceito de classe, abordando um vocabulário entre gírias, expressões regionais e neologismos, para encaixar palavras de efeito. Isso sem perder a métrica, que se consagra a cada speed flow e com a surpresa de um refrão pop para dar a dinâmica entre um verso e outro.
Com este lançamento, Rashid encerra 2018, ano em que lançou ‘’CRISE’’, seu segundo álbum de estúdio, com o qual firmou o prestígio de ser considerado um dos rappers mais influentes do país, capaz de falar com molecada e à elite cultural através de um rap mais acessível mas nem por isso mais raso.
Em entrevista exclusiva para o Poltrona VIP, os Rappers falam um pouco mais, sobre a parceira, as letras e todo o processo de produção do novo single. Confira:
Poltrona Vip: Como surgiu a parceria entre vocês dois e o que pretendem levar com essas música para o público?
Rashid: A parceria surgiu, na verdade faz um tempo, faz uns bons anos que a gente se encontra no camarim, nos bastidores dos shows e o pessoal não tem muita noção às vezes, por que não vê as fotos, pessoal acha que não conhece. E faz muitos anos que a gente sempre comenta: ‘’precisamos fazer aquela lá’’, e aí em 2016 o RAPdura me fez uma visita em casa, a gente trocou belas ideias, sobre vivência, porque ele vem do ceará e eu tenho uma vivência muito especial no interior de Minas Gerais, na cidade chamada serra de ijaci e a gente começou a falar sobre esse lance também, do rap que vem de outros lugares, invadindo a cena, invadindo a megalópole e foi aí que surgiu essa ideia de fazer essa música, dessas idéias nossa, e é um discurso também que o RAPdura já tem bem forte na carreira dele e agora foi a minha vez de trazer o meu parecer também, conseguir valorizar, mostrar essa outra página do rap brasileiro, da realidade brasileira A gente tem conseguido enxergar vários artistas fora do eixo Rio – São Paulo, um grande momento para o rap neste sentido, mas mais do que isso, enxergar essas outras realidades, outra perspectiva.
RAPdura: A mensagem ela tem um duplo sentido, ‘’Interior’’, o rap ele vem da nossa vivência, vem de dentro. E as pessoas saem muitas vezes do interior para ir para a cidade trabalhar e faz tudo isso aqui acontecer, então é uma homenagem a essas pessoas que sai de lá e vem batalhar e consegue ter sua dignidade, que é o mais importante.
Poltrona Vip: Nos versos que compõe a música, vocês abordam assuntos como, xenofobia, luta de classe, preconceito, e da pra sentir essa emoção quando a gente escuta a música. Como foi esse processo, de colocar isso para fora e como foi gravar isso?
RAPdura: O rap sempre abordou, desde a época que eu conheci o hip hop, sempre abordou questões raciais, questões sociais, também foi abordada a questão dos indígenas que é muito importante. Falar sobre essas pessoas que não tem voz, que está lá longe, nem sempre você conhece um grupo de rap do norte, que é a região mais abandonada. E foi muito importante abordar esses temas, que muitas vezes não são falados, ao mesmo tempo não são tão falados. E a gente quis trazer a tona todos esses temas, principalmente todas essas questões que não são tão abordadas.
Rashid: Total. É como o RAPdura falou, é uma coisa que o Rap fala tanto, que meio que fica injetado na nossa mente, a gente sempre tem esse monte de coisa para falar e isso meio que vai se renovando todo dia, quando a gente olha o noticiário, aquilo ali já traz uma porção de coisas para a gente fala. Acho que essas questões é bastante importante, como eu disse, é uma coisa que o RAPdura já trazia em suas letras, e o Rashid não trazia tanto, principalmente essa coisa do ‘’interior pra dentro’’. Esse lance da causa indígena, da xenofobia, essa coisa ‘’geográfica ‘’ da coisa que eu não trazia tanto. E é muito louco ver isso, acaba sendo uma forma também, de fazer as pessoas olharem o caminho inverso. Hoje existem pesquisas e estatísticas que indicam que as pessoas tem feito o caminho contrário também, e é uma forma agora, de fazer o nosso pessoal do rap, enxergar ao contrário, a riqueza que ta no interior.
Poltrona Vip: E como foi o processo de produção, desde o começo, da letra até o clipe?
Rashid: É um processo sempre natural pra gente, é até difícil de explicar, não tem muitas palavras bonitas para isso no caso. O Skeeter (produtor), pediu para gente escolher escolheu vários instrumentais, o Skeeter foi o que mais agradou a gente, pela sonoridade e vamos dizer que ela tem até uma textura que tem uma cara do tipo de som que a gente estava procurando pra música, não só por ser pesada, mas ela tem aquela coisa, uma estética musical que a gente estava buscando e a partir dali, tudo começou a se encaixar mais facilmente, as letras nasceram. A gente tinha conversado, mas acabou cada um escrevendo na sua casa e depois a gente mostrou os versos, a última parte da música, que a gente intercala os versos, a gente escreveu juntos. Acho também que isso fez a coisa ficar mais natural, mas não teve muito mágica. O rap normalmente é sempre uma fotografia do momentos, então acaba sendo um processo muito natural. E é curioso como a gente querendo mostrar uma riqueza que vem da região interioranas, também acaba citando várias situações triste e o descaso de certa forma das pessoas com essa outra realidade
Poltrona Vip: Para finalizar, logicamente vocês escutam muito Rap e eu queria saber quando foi que vocês sentiram esse clique de que vocês tinham que falar sobre, e todo esse processo para se tornar um rapper que vocês são hoje?
RAPdura: Eu canto desde criança com meu pai, no ceará nessa época não existia rap, era o Rap Brasil, que era o Funk na verdade.Eu conheci o Hip Hop atravez do Break, eu comecei dançando e naturalmente naquela época, todos os elementos eram muito envolvidos, os eventos eram de Hip Hop mesmo, o cara que dançava geralmente ele rimava e fazia outros bagulho, vários desenhos, grafite e eu entrei no Break e depois eu vi que o Rap me chamava muito, porque eu dançava e fazia uns versos, ficava brincando, isso com 13 anos. E é uma parada interessante, eu não conhecia, so que parece que eu já nasci fazendo aquilo, eu fazia minha letras desde os 13 anos, já cantava e eu era a única criança nesse meu ambiente que fazia Rap, aí ficava fazendo umas rimas para os cara e nunca mais parei.
Rashid: Ele conheceu através da dança e eu conheci através do grafite, foi assim que eu entrei no Hip Hop, eu queria ser Grafiteiro, viajar o mundo, fazendo minha arte, que no caso seria o grafite, só que para a minha situação de vida naquele momento, o grafite era um elemento muito caro, eu não conseguia comprar tinta e esse tipo de coisa, continuei desenhando uns bons anos da minha vida. Mas o lance que me fez começar a escrever é que os grafiteiros, vários deles tem o costume de escrever várias frases de efeito do lado da arte deles, alguma frase da bíblia, de filósofo, só que eu achava que era deles, então, eu me forçava a pensar em umas frases, eu queria fazer as minhas frases de efeito.
Eu já gostava de Rap, e quando a minha paixão começou a se intensificar essas frases, em pulo começaram a passar a se transformar em uma rima, duas rimas, três, quatro, uma página, duas páginas e quando eu vi eu estava empenhado. Ai fazia grupo com a molecada da rua. Não tinha perspectiva, o lance de você dar certo no Rap, era só o fato de você conseguir viver do seu Rap, se você conseguisse fazer um show, não importa se pra 10 ou 100 pessoas, já sobrevivia do seu Rap, não tinha isso, de entrevista visualizações. A perspectiva era totalmente diferente.