FOLK FEST – Encontro especial reúne nomes do Folk Music no Circo Voador
Sexta-feira, 31 de março de 2017. O Circo Voador voltou seus olhos para um gênero que tem grandes apaixonados no Rio e está tomando conta, não apenas dali, mas do Brasil inteiro. A expressão “folk” surgiu no século XIX, provinda do termo “folk lore”, música gerada pelo saber popular. Bob Dylan, desde os anos 60, é um dos nomes mais importantes para a difusão do estilo, que na última sexta-feira dialogou com o rock, o indie, o pop e a música celta no Folk Fest, na Lapa. Se apresentaram Suricato, OutroEu e Café Irlanda.
A ideia do Folk Fest surgiu para abraçar o gênero, de forma a estabelecer-lhe uma identidade. Segundo Rodrigo Suricato, o objetivo é criar uma cena em relação a ele. “Eu acho que é um pouco [para] unificar as bandas que já fazem isso, pelo Rio de Janeiro, pelo Brasil…Como alguns estilos, que já tem uma união muito forte. Não é aquele protecionismo, mas a gente tem que estar juntos das pessoas que estão fazendo isso por aí”, declarou.
Folk, Indie Brasileiro, Pop Rural, nova MPB: as nomenclaturas conversam entre si, passeiam pelas diferentes denominações e carregam muitos fãs na era do streaming. Nesse meio, o vocalista da Suricato fez ressalva a nomes como Rubel e o duo Anavitória. “Estou bem curioso com esses trabalhos que muita gente tem feito, o que o pessoal chama de ‘pop rural’, digamos assim.” Essa caracterização têm sido uma das opções de estilo pro Brasil.”
Além da Suricato, a nova responsabilidade de Rodrigo a partir deste ano é caminhar junto ao rock do Barão Vermelho, desde que entrou na banda, após a saída de Frejat. Nada de abandonar ou negligenciar um dos dois projetos. “Eu estou Barão Vermelho, eu sou Suricato”, ele confirmou. Não foi apenas o Barão que passou por mudanças na formação. Agora, com Miguel Bestard, Thiago Medeiros, Cauê Nardi e Cesinha, além de Rodrigo e Raphael Romano, da antiga composição de integrantes, os planos da Suricato são de conciliar a agenda de shows com os preparativos para um novo álbum. “Com a formação nova, a gente tá doido pra entrar logo em estúdio para gravar pro nosso disco”, completou.
A Suricato veio do Lollapalooza na semana passada e trouxe aquela energia vibrante do festival para fechar a noite chuvosa. Os destaques foram para um emocionante cover de Blowing in the Wind, de Dylan, na voz do uruguaio Miguel Bestard, e para as músicas mais recentes de trabalho como “Admirável Estranho”, “Na Mão As Flores” e “Amor de Sol”, composta em parceria com Paulinho Moska. O repertório novo está sendo testado pela banda e agradou muito ao público. Além disso, eles não deixaram de tocar as favoritas dos CDs Pra Sempre Primavera (Diante de Qualquer Nariz, Talvez) e Sol-te (Bom Começo, Trem, Um Tanto). Ao fim, Cauê Nardi apresentou uma canção autoral.
OUTROEU
A televisão continua sendo um grande difusor musical, principalmente através dos reality shows de bandas que nos trazem as versões mais inusitadas de músicas famosas junto a tesouros autorais escondidos. Foi no programa SuperStar que tanto a Suricato quanto a OutroEu ficaram conhecidos no Brasil.
Mesmo sem ter lançado CD, a banda de apenas um ano e meio possui um repertório de tirar o fôlego, mesclando músicas próprias a covers completamente distintos das músicas originais, em um estilo único. Dentre as já conhecidas versões de “Budapest“, “Dona Cila” e “Hold Back The River“, também foram surpreendentemente impressionantes as performances de “Sexual Healing” e “Aquarela”. Em resumo: possuem a maestria de transformar canções que já são belas em espetaculares.
E não é para menos. Fica mais fácil aprender o ofício quando se tem bons professores. As influências da OutroEu, segundo Mike Túlio e Fil Lopes (vocais e baixo, respectivamente) vão de John Mayer, James Morisson, Jamie Cullum, ColdPlay, James Taylor, internacionalmente, aos brasileiros Maria Gadú, Los Hermanos, Djavan, Rubel e Caetano Veloso. “Teve um lance com Caetano, ele chegou a conversar comigo”, contou Mike. “Tava na praia, tocando ukulele, ele chegou, do nada, falando comigo! Ele sempre foi referência pra mim, então entendi como um sinal pra continuar na música”, lembrou.
Os amigos se perdem em meio às referências. “São muitas”, disse Fil. Questionados sobre com quem gostariam de tocar, ponderaram, mas chegaram a um consenso: James Bay, Chris Martin [do ColdPlay] e John Mayer.
Os amigos descobriram no reality show o gênero que poderia defini-los. “Antes, eu demorei um pouco pra entender o que era o folk. Era tudo o que eu gostava, mas não tinha um nome”, explicou o vocalista. Eles compartilham com Rodrigo a vontade de fortalecer a cena folk no Brasil. “Eu acho incrível, fazer um show com o Suricato, que é uma banda absurda, também de amigos nossos. Tem a galera da Pagan John, o pessoal que tá tocando aí também, hoje… é toda uma coisa que a gente quer estimular”, finalizou Mike.
Além de shows, a Outroeu está se preparando para lançar o primeiro álbum ainda nesse mês de abril. O nome ainda não foi revelado e até em relação aos próximos singles eles fazem mistério – só para aumentar a ansiedade entre os fãs.
CAFÉ IRLANDA
Simpáticos e despretensiosos, quem fez a abertura e a comunicação entre os shows no Folk Fest foram os gênios da Café Irlanda. Eles trazem ao Brasil uma outra vertente do folk, que surgiu na Irlanda. Flauta, violão, violino e até uma viela de roda misturam a música de origem celta com baião, forró, e pasmem – até um funk. Um tímido instrumental de “Baile de Favela” soaria imperceptível no meio do show para quem não conhece a música, de tão bem costurada.
Kevin Shortall, dos vocais e do violão, explicou a preferência do ritmo nordestino para misturar Brasil e Irlanda. “Historicamente, os dois países não tiveram uma comunicação musical. Mas a estrutura da música nordestina e irlandesa têm muito em comum. É o que a gente chama de música modal, que é um tipo de música muito mais antigo, que precede a clássica europeia.” Daniel Sinivirta, flautista, se divertiu ao comentar a similaridade dos sons. “Tem algumas músicas irlandesas de uma artista chamada Sharon Shannon que brasileiro ouvindo pode jurar que é um forró sendo tocado.” Para ele, parece tanto que chega a confundir.
Rique Meirelles, (violino, viela de roda, vocal) apontou que o repertório da banda ainda possui a maior parte irlandesa. “Ele ainda não tem tanto de Brasil quanto a gente gostaria. A gente escolhe muito a dedo o que vai ter de brasileiro, e o que a gente escolhe, sempre puxa pro baião.” Asa Branca, Feira de Mangaio e Anunciação ficam mais espetaculares com flautas e violinos do que você imagina. No site oficial da banda, há canções para baixar gratuitamente.
Como revela o nome, as Irish Drinking Songs possuem o costume de levarem letras para beber e dançar, e o Circo Voador dançou ao som das divertidas canções originais “Estamos Todos Bêbados” e “Se Eu Cair Não Me Levante”. Durante a apresentação, Kevin brincou sobre o assunto: “nem só de beber muito vivem as canções da Irlanda. Também temos músicas sobre matar os ingleses. Aqui vai uma sobre matar os ingleses.” Logo em seguida, Rique completou: “nada contra os ingleses”.
E realmente, não há nada contra eles. Isso porque Rique é um admirador do trabalho de Ed Sheeran, que no último álbum, Divide (÷), levou influências irlandesas notáveis às canções “Galway Girl” e “Nancy Mulligan“. A inclusão do folk na música pop leva o gênero ao gosto popular, e o violinista é a favor da iniciativa. “Eu adoro, sempre gostei. Gosto muito de The Corrs, que já faz isso há muitos anos. Começaram a mesclar pop com influências folk irlandesas e acho que funciona muito bem, porque abre portas pra uma galera que não conhece essa sonoridade.”
Passado o Saint Patrick’s Day em março, a banda, que tocou no Circo Voador pela terceira vez, tem conversado sobre o planejamento do álbum, que está nos planos para o final de 2017/início de 2018.
O casal Mariana Amaral e Ricardo Sul, já foi para a Lapa com boas expectativas. “Já fomos em dois shows da Suricato… um e meio. Um da banda e um só do Rodrigo, um especial. A gente já ouviu falar da OutroEu. Estamos com esperança de gostar das outras, pra conhecer mais”, disse Mariana. As fãs de OutroEu, Amanda e Letícia, vieram de longe para ver o concerto. “A Suricato eu já conhecia duas músicas e amei o show deles”, disse Amanda.
Ao fim do show, os três grupos se reuniram no palco para apresentarem juntos a canção “Eclipse Oculto”, de Caetano. É possível perceber que nosso folk carioca tem inúmeras referências de vários lugares do mundo. É como diz Rodrigo Suricato, somos um povo “estrogonofe com feijão” – feito de misturas. Na música, essa mistura têm resultado em um delicioso banquete.